Versos 82-92

Logo algo vais ousar mais feio que essas roupas;
Ninguém fica tão torpe de repente: acolhe-te
Aos poucos quem em casa põe fitas compridas
Na testa e envolve seu pescoço com colares
E a Boa Deusa aplaca com ventre de porca
E grandes taças. Mas por hábitos estranhos
A mulher acossada não passa em tal porta:
O altar da deusa é só dos machos: "vão, profanas!"
Gritam, "não geme aqui flautista em tuba alguma!"
Faziam tais orgias com fachos secretos
Baptas bons em cansar a cecrópia Cotito.

foedius hoc aliquid quandoque audebis amictu;
nemo repente fuit turpissimus. accipient te
paulatim qui longa domi redimicula sumunt

frontibus et toto posuere monilia collo 85
atque bonam tenerae placant abdomine porcae
et magno cratere deam. sed more sinistro
exagitata procul non intrat femina limen:
solis ara deae maribus patet. 'ite, profanae,'
clamatur, 'nullo gemit hic tibicina cornu.' 90
talia secreta coluerunt orgia taeda
Cecropiam soliti Baptae lassare Cotyton.

Na extensão do argumento anterior, em que se falava do caráter contagioso do vício de Crético, agora se acrescenta o caráter progressivo: quem começa assim, fará coisas cada vez piores.

O que é esse pior, contudo, é uma situação cujo contexto precisa ser mediado para que o leitor pouco familiar entenda: o próximo passo é Crético ser admitido no culto da Bona Dea. Essa era uma divindade latina cujo culto envolvia sacrifício e libação (como Juvenal descreve nos versos 86 e 87), mas cujos mistérios eram reservados apenas a mulheres. É famoso o escândalo envolvendo esse culto em 62 a. C., quando Clódio, político da época, se vestiu de mulher para invadir o culto. A fonte novamente é Cícero (em especial as cartas a Ático 1, 13, 3; 1, 14, 5-6 e 1, 16). A própria reminiscência do caso já dá uma ideia do afeminamento de Crético, mas Juvenal aumenta o grotesco da imagem: quem recebe o causídico usa fitas e colares. Mas, de repente, revela-se que não são mulheres as iniciadas, mas homens. O tom com que Juvenal comenta é de aberração - o que é esperado, já que, falamos antes, o valor central da cidadania romana é a atividade, da qual um efeminado está abrindo mão - e é amplficado no símile dos versos 91-92, que equipara essa cerimônia a um culto ainda mais estranho, e estrangeiro.

Baptas são os sacerdotes da deusa Cotito, de quem possuímos pouca e confusa informação. Parece que o culto tinha origem na Trácia e era de caráter orgiástico. Praticava-se em Atenas (a Cecrópia), mas o Sudas regida site culto em Corinto também.

Não custa, nesse ponto, para efeitos da coesão textual, lembrar do sacerdote Peribômio, castrado, efeminado, praticante de um culto exótico.

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