Versos 143-152

Tal monstro, Graco vence com tridente e túnica,
Gladiador que foge no meio da arena
Mais nobre que Marcelo ou Capitolino,
Que os Cátulos, os Fábios, a estirpe de Paulo
E todo o camarote, mesmo que entre todos
Juntes o autor do jogo em que ele joga a rede.
Que existem outros manes, reinos subterrâneos,
Cocito e negras rãs nos abismos do Estige
E uma só barca cruza tantos mil num rio
Nem as crianças creem, só se não pagam banhos.

uicit et hoc monstrum tunicati fuscina Gracchi,
lustrauitque fuga mediam gladiator harenam
et Capitolinis generosior et Marcellis. 145
et Catuli Paulique minoribus et Fabiis et
omnibus ad podium spectantibus, his licet ipsum
admoueas cuius tunc munere retia misit.
esse aliquos manes et subterranea regna,
Cocytum et Stygio ranas in gurgite nigras, 150
atque una transire uadum tot milia cumba
nec pueri credunt, nisi qui nondum aere lauantur.

Aqui, a mudança de tema confirma que, embora o objeto do poema passe pela sexualidade, ele trata mais amplamente de valores, e em especial de valores da elite. É por isso que Juvenal passa por cima do travestimento de Graco com outro crime que julga pior, o expor-se como gladiador na arena.

Os versos ressaltam o lugar social ínfimo que os gladiadores ocupavam (sabemos que, embora gozassem de admiração, eram usualmente escravos com expectativa de vida mínima), indigno de que uma pessoa da nobreza desse Graco disso se ocupasse. O pretenso gladiador é mais nobre que grandes vultos da história romana e que todos os membros da audiência, inclusive o próprio imperador (quem oferece os jogos).

O ponto em comum de ambos os atos de Graco é a recusa dos valores da classe aristocrática por um membro dessa própria classe, já que nos dois casos fala-se da submissão do homem a outro homem. No caso de Graco-noiva, a submissão sexual e doméstica, no de Graco-gladiador, a submissão de se colocar como objeto de entretenimento para pessoas de extração social inferior.

No verso 149, um novo corte se opera e o poema começa a chegar à sua peroração, abandonando exemplos específicos e discutindo o problema moral de forma mais ampla.

E essa discussão começa em grande estilo, tocando em aspectos metafísicos centrais das crenças romanas. Diz Juvenal, com efeito, que em seu tempo não se acreditava nas narrativas tradicionais do que vinha após a morte.

Os manes são os fantasmas, sombra dos mortos, bem como as divindades do mundo inferior; Cocito (acolho aqui esta interpretação dos manuscritos) e Estige são corpos d'água que correm por esse subterrâneo mundo de mortos, através do qual barcos conduziam as almas sem peso dos mortos na terra (e, por isso, podiam ser transportados em grande número sem que o barco afundasse).

Pois bem, o poeta é categórico, ninguém mais acredita nisso, além daqueles que não pagam para entrar nos banhos, ou seja, as criancinhas. (Nesse verso, nossa tradução é um pouco perifrástica; Juvenal diz literalmente que nem as crianças creem, a não ser as que ainda não se lavam por bronze, as moedas de bronze de pagamento do ingresso nos banhos públicos).

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